A
SESUNIPAMPA conversou com a presidente da Seção Sindical do ANDES-SN na UFRGS,
Rúbia Vogt, sobre os impactos da pandemia do coronavírus na comunidade
acadêmica e como a proposta de ensino remoto vem trazendo preocupações para as
Universidades do Brasil.
A
pandemia da COVID-19 assola nosso país a mais de 3 meses e seus impactos são
diversos. Estabelecimentos, instituições, comércio, todos estão buscando
alternativas que reduzam os efeitos da pandemia e de alguma forma garantir o
funcionamento desses espaços.
Nas universidades as aulas
presenciais foram todas suspensas, e sem previsão de um retorno seguro, algumas
aderiram a modalidade de ensino remoto. Na UNIPAMPA, o debate sobre um possível
retorno surge de maneira atropelada e recentemente. Com a justificativa de “não
perder o ano acadêmico” a reitoria apresentou uma proposta de calendário que
não contemplou a comunidade acadêmica, gerando muitos debates em todas as
categorias, causando preocupação e aflição aos vulneráveis socialmente, que
logo se viram excluídos da proposta.
Deixando várias lacunas a serem
preenchidas, a proposta ainda se encontra em discussão e não foi aprovada pelo
CONSUNI, tendo em vista que a categoria docente ainda apresenta muitas questões
e exige explicações por parte dos proponentes, pois entende que além da
problemática dos discentes possuírem acesso ou não, questões trabalhistas
também não foram explicitadas.
Voltamos
ao “normal”?
Mesmo com toda problemática que
estamos vivendo, surge em nossa sociedade uma discussão que leva a pensar que
estamos entrando em um novo momento, considerado o “novo normal”, como se fosse possível excluirmos a importância da interação
social de maneira presencial. As reuniões de trabalho, organização, grupos ou
qualquer segmento que se faz necessária discussão em grupo ocorrerem de maneira
virtual seria o considerado, “novo normal”.
Compras pela internet, seja de insumos de sobrevivência ou utilidades gerais,
desconsiderando trabalhadores nesse processo e tornando suas funções
desnecessárias, também seria considerado o “novo normal”.
O que não se discute, e não se
considera o novo normal, é o adoecimento das pessoas de maneira geral, enquanto
número de mortes pela COVID-19 e enquanto adoecimento psíquico por parte não só
dos trabalhadores como de crianças, jovens, adultos e idosos fora dos espaços
produtivos de trabalho. A população é afetada e sofre de todas as formas, desde
a mãe que esta com seus filhos em casa sem aulas presenciais ou acesso aos
materiais de estudos, a própria criança sem o espaço de interação social e
aprendizagem, o idoso que hoje limita suas atividades e contatos visando
preservar sua vida, os professores (sejam eles do ensino superior ou da
educação básica) que estão trabalhando de maneira remota, sem nenhum auxilio
dos governos e sem garantia de que seu conteúdo esta chegando aos educandos.
O novo normal esta sendo considerado
dentro de um contexto onde a pandemia não esta contida e onde não há sequer
perspectiva de um retorno realmente ao estado de normal, já que o normal é que
o povo esteja em segurança, com saúde e tendo acesso a todos os serviços que o
Estado deve proporcionar.
Considerar um retorno das aulas
dentro dessa análise, de um falso novo normal, que na prática aliena a
população referente a realidade vivenciada hoje, é algo cruel e que fere
diretamente a condição humana que deve ser digna. Não é, e não deveria ser um
problema que o ano de 2020 seja excluído do calendário acadêmico, pois, não
depende da reitoria, dos professores, alunos ou técnicos a contenção da
pandemia, e sim, única e exclusivamente dos governos.
A discussão que deve ser feita no momento, é
da ampliação das atividades que os docentes já vem exercendo para a oferta de
disciplinas que auxiliem em carga horária complementares, como DCGs e ACGs.
Mesmo mantendo uma rotina de trabalho durante a pandemia, o senso comum
reproduz que os servidores públicos estão recebendo sem trabalhar, o que é uma
falácia. Existem alternativas que podem ser pensadas visando a não exclusão dos
vulneráveis socialmente e dos que se encontram em situação de adoecimento. Em
meio a perda de entes queridos e do povo brasileiro em geral, impor um retorno
das atividades acadêmicas obrigatórias é uma atitude violenta e agressiva para
com as pessoas.
Entrevista
da semana
A SESUNIPAMPA conversou com a Rubia
Vogt, que é presidente da Seção Sindical do ANDES-SN na UFRGS, e debateu sobre
as questões apresentadas acima, buscando ampliar a construção de uma
alternativa que não seja excludente e que contemple as Universidades sem
precarizar a educação público e o processo de ensino-aprendizado, visando não
prejudicar nem discentes e nem docentes durante a execução de seu trabalho.
SESUNIPAMPA: O
que a pandemia afetou e vai afetar nos processos educativos nas universidades
do Brasil?
Rubia: “Penso que a situação que se apresenta para
o campo da educação como um todo, independente do nível, etapa, modalidade, é o
aprofundamento de desigualdades. Com a suspensão das atividades presenciais,
por conta do imperativo do isolamento social para conter o avanço do
Coronavírus, atividades de ensino estão sendo mediadas por tecnologias. Não há
uma transposição direta entre presencial e digital, e resta saber se esta
mudança se traduzirá em aprendizagem. Temos no país um sério problema de acesso
ao mundo digital, seja por conta da falta de pacotes de dados ou da limitação
deste, seja pela ausência de dispositivos eletrônicos. Na educação básica,
temos muitas famílias com apenas um aparelho de celular para atender a todos de
casa. Então, crianças e jovens se revezam no uso deste aparelho, que não foi
pensando como um dispositivo para estudo. E este mesmo celular ainda é de uso
dos adultos, até para fins de trabalho. Na universidade pública, temos de
pensar que, junto com as ações afirmativas que aos poucos estão mudando as
instituições, precisamos de políticas de permanência: muitos(as) discentes
dependem de auxílio para moradia, alimentação, transporte, compra de materiais,
etc. Ainda, com a crise econômica e seu aprofundamento na pandemia, muitas
famílias dos(as) estudantes perderam suas fontes de renda, o que diminui as
chances de poder se dedicar aos estudos, pois muitos(as) jovens e adultos(as)
precisam usar seu tempo para buscar uma alternativa para a sobrevivência. A
crise sanitária também afeta a rotina, com sobrecarga de trabalho doméstico e
situações de adoecimento psíquico. Em meio a este cenário pandêmico, as
universidades públicas mais uma vez mostraram sua relevância para a sociedade
brasileira. Mesmo com os constantes e aprofundados cortes de verbas, mesmo com
as acusações infundadas e ataques vindos do chefe máximo do Ministério da
Educação, junto aos(às) servidores(as) as universidades seguiram contribuindo
no combate à Covid-19. Por meio da pesquisa e da extensão, as universidades e
também os institutos federais seguem atuando promovendo soluções na área da
saúde; e não só: todas as áreas estão ativas e contribuindo, como, por exemplo,
as pesquisas de ciências humanas que analisam e registram os diversos aspectos
da pandemia.”
SESUNIPAMPA: Como
avalias as propostas de ensino remoto que tem sido propostas na atualidade
pandemia?
Rubia: “Chama a atenção que em poucas semanas se
naturalizou um conceito antes bastante desconhecido: o “ensino remoto” e suas
variantes lingüísticas. De um lado, temos um desejo muito humano de alguma
“normalidade” ao recuperar práticas e rotinas interrompidas pela pandemia, a
boa vontade de docentes e técnicos(as); do outro, a questão do aprofundamento
das desigualdades, pois quem já tinha dificuldades para estudar, terá ainda
mais. Vemos estudantes e também os pais da educação básica preocupados com se
perder o semestre, se perder o ano letivo. No entanto, o que está
verdadeiramente em jogo é a preservação da vida, a qual, se perdida, não tem
volta, diferente da aprendizagem, que se retoma. Vemos algumas instituições que
não estão conduzindo os processos de implementação do ensino emergencial de
forma democrática, pois estão prescindindo do diálogo e amplo debate com a
comunidade acadêmica. Também desconsideram as condições de acesso dos(os)
discentes e a precarização do trabalho de técnicos(as) e docentes a partir de
suas casas, sem formação em ead – que possui regulamentação e didática própria
– e com seus próprios recursos materiais. Outro aspecto que merece atenção é
que as propostas de ensino emergencial são uma larga porta aberta para
aprofundar a privatização da educação pública. Não se trata de um leilão de
transferência, mas da compra de pacotes e plataformas de empresas privadas, as
quais, no caso das universidades públicas e institutos federais, ainda terão
acesso não só ao ensino, mas também a dados e à produção de conhecimento por
meio das pesquisas empreendidas por estas instituições. Gostaria de mencionar
também o aumento de casos de invasões a atividades no ambiente educacional
digital (palestras, aulas, etc), com ataques racistas, machistas, homofóbicos.
Há pouco lutávamos pela preservação de nossas aulas; agora, estamos nos expondo
digitalmente sem segurança. Todo o malabarismo lingüístico em torno do ensino
remoto, parece, é para evitar que se diga que se trata em muitos casos, de uma EaD
precarizada.”
SESUNIPAMPA: O que seria uma volta alternativa com
semestres sem uma oferta regular e qual sua importância?
Rubia: “Não podemos desconsiderar os(as) alunos(as)
que podem e que gostariam de manter algum vínculo, nem a vontade de
técnicos(as) e professores(as) em retomar as atividades de ensino. Por outro
lado, não podemos proporcionar uma continuidade para alguns, deixando
tantos(as) outros(as) para trás, acentuando desigualdades por meio da educação.
Aliás, mesmo dentro do grupo de estudantes que têm condições de acesso ao
ensino remoto, é preciso atenção a casos específicos, às questões de gênero,
por exemplo. As alunas mães (assim como técnicas e professoras) têm demandas
próprias no ambiente acadêmico, que se agudizam na quarentena e necessitam de
atenção especial. Acredito que os(as) formandos(as) também merecem um outro
olhar neste momento, diante da possibilidade de conclusão de curso. Então, além
da atenção a cada discente, podemos pensar em disciplinas eletivas, em
atividades de pesquisa e de extensão, em projetos voltados para o contexto da
pandemia; em serviços prestados à população em geral. A suspensão das atividades
presenciais nas universidades e institutos federais não parou estas
instituições. Seguimos ativos e atuantes.”
Fortaleça a luta sindical e
a SESUNIPAMPA na defesa da categoria docente, filie-se!
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