NOTA DA DIRETORIA DA SESUNIPAMPA SOBRE CONJUNTURA NACIONAL E CONSTRUÇÃO DE GREVE
No último período, a sociedade brasileira tem atravessado uma das situações políticas mais cruciais de sua história recente. Os acontecimentos deste ano refletiram o avanço da onda conservadora, e foram decisivos na derrubada do governo Dilma através do impeachment. Este processo revelou-se extremamente questionável em termos de legitimidade jurídica, forçado por alianças políticas escusas entre a grande mídia, o alto empresariado, setores da classe média, o poder Judiciário e o Parlamento.
Se esta destituição ilegítima do governo anterior é caracterizada por muitos como um golpe, o certo é que este não se resume ao impeachment: os mesmos setores que o promoveram agora sustentam o governo de Michel Temer para aprofundar o retrocesso das liberdades democráticas e dos direitos sociais (alguns mesmos iniciados antes do impeachment, ainda no governo Dilma, a exemplo da aprovação da “Lei Antiterrorismo” e da proposição da PLC 257). Aproveitando-se da situação de assumir o poder como consequência da deposição da presidenta eleita (o que, paradoxalmente, o livra de ter que responder a alguma base eleitoral), Temer e seus associados foram incumbidos de realizar o “trabalho sujo”, a serviço da alta burguesia nacional (representada pela FIESP e outras entidades patronais), estabelecendo ataques intensivos a diretos sociais como Educação e Saúde Pública, Previdência Social e CLT, o que configura, de modo mais profundo e histórico, um golpe injustificável na Constituição Cidadã de 1988.
Medidas extremas não faltam no que tange à Educação. A Medida Provisória 746/16, conhecida como “Reforma do Ensino Médio”, enfraquece a formação escolar ao tornar não mais obrigatório aos alunos matérias como Artes, Educação Física, Sociologia e Filosofia, além de fragilizar a já vilipendiada formação de licenciatura, ao permitir que pessoas de “notório saber” possam atuar como educadores. Projetos de lei que circulam nos órgãos legislativos de âmbito municipal, estadual e federal (inclusive já tendo sido aprovados em algumas localidades) inspirados no Programa “Escola Sem Partido” visam ao impedimento de qualquer formação crítica dentro das salas de aula, criando condições para a perseguição política e o indiciamento legal de educadoras e educadores, intenções escondidas sob o frágil argumento de combater a “doutrinação política, partidária e ideológica” nas escolas.
Já a PEC 55/16 (antiga PEC 241, já aprovada na Câmara) atinge frontalmente as condições de realização de uma Educação Pública de qualidade, mas não apenas esse setor. Ao congelar os gastos públicos por 20 anos, limitando o orçamento anual das esferas do Estado sempre aos gastos do ano anterior corrigidos pelo IPCA (na verdade, o governo estimará um valor para a inflação para construir os projetos da LDO e lei orçamentária), a medida propiciará grande sucateamento dos serviços oferecidos pelo Estado, pois ela desvincula as despesas com Saúde e Educação do percentual da receita de impostos, previstas no texto constitucional.
Os prováveis efeitos, em caso de aprovação da PEC, já estão sendo divulgados por diferentes instituições. O DIEESE (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) utilizou a regra prevista pela PEC para calcular qual seria o orçamento de educação e saúde públicas desde 2002, caso a proposta tivesse em vigor em 2001. Os números são alarmantes. No ano de 2015, por exemplo, ao invés dos R$ 75,6 bilhões que foram investidos em educação, as medidas previstas na PEC fariam com o que o orçamento fosse de R$ 29,6 bilhões – uma redução de R$ 46 bilhões. De 2002 para 2015, as regras da PEC fariam com que o orçamento da educação acumulasse perdas de R$ 268,8 bilhões – o que representaria um corte de 47% em tudo o que foi investido em educação nesses 14 anos.
Os efeitos da PEC sobre o futuro da universidade pública brasileira são tão nefastos que estão obrigando aos seus dirigentes – de diferentes matizes e simpatias políticas - a manifestarem-se publicamente em relação a tal medida.Na UFRJ, o reitor Roberto Leher há tempos expôs o perigo de suas consequências para a Educação como um todo. Já na UFRGS, o reitor Rui Oppermann tornou público o impacto material da redução do orçamento, o que impediria o crescimento da universidade nos últimos dez anos (caso estivesse em vigor desde 2006). Na UNIPAMPA, na última reunião do CONSUNI, os conselheiros também aprovaram moção de repúdio à PEC, demonstrando seu caráter terrível para a manutenção da universidade.
Aliás, a PEC incidirá sobre um cenário no qual nossa universidade já agoniza financeiramente, assim como todas as outras universidades públicas brasileiras. Na primeira metade de 2016, a reitoria repassou os cortes orçamentários que atingiram os 44% das verbas de custeio. As consequências foram perversas, a exemplo da demissão de dezenas de trabalhadores e trabalhadoras terceirizadas. Para este ano o MEC apontou em reunião com a ANDIFES o acúmulo de cerca de 8% de corte em relação ao do ano passado, sem recuperar o índice da inflação, que ficou em 10%, o que prevê mais cerca de 20% de cortes para o ano que vem. O orçamento que já havia caído pela metade, sofrerá ainda maior corte (e isto sem levar em conta os efeitos da PEC, uma vez aprovada). Sabemos que a matriz orçamentária para PLOA 2017 (custeio e capital) proposta pela nossa universidade não será executada pelo governo, que estimou em 60% a menos do que requerido. Ou seja, nossa universidade viverá de forma agudizada a precariedade, o que afetará drasticamente nosso cotidiano de trabalho.
Ao contrário do que têm apregoado governo, imprensa, lideranças e entidades empresariais, que apresentam esses “remédios amargos” como imprescindíveis para tirar o país da “crise”, existem muitas alternativas.Desde há algum tempo, o ANDES-SN e outras entidades sindicais e movimentos sociais têm realizado campanha pela auditoria da dívida pública (prevista na Constituição), que consome anualmente quase metade do orçamento do Estado e garante o enriquecimento de banqueiros e de outros especuladores. Se a dívida fosse auditada, e comprovada sua ilegalidade, ao menos em parte (conforme sustentam estudos e aponta a própria CPI da Dívida, finalizada em 2010), bilhões de reais ficariam nos cofres públicos, e logo, poderiam ser investidos na Educação e Saúde, sem prejuízo nas contas. Outras medidas como a taxação das grandes fortunas (também prevista na Constituição), uma vez aplicadas, também representariam importantes somas para o orçamento da União e dos estados.
O sinal ainda não está fechado, a luta ainda não está perdida. As ocupações em escolas, institutos federais e universidades, protagonizadas por estudantes de todo o Brasil, têm demonstrado o quanto é necessário resistir e lutar pelo seu futuro. Esses jovens têm enfrentado, ora o silêncio, ora a depreciação, por parte da imprensa em relação ao movimento, a fúria de pais e alunos com compreensão limitada da situação, e especialmente, a atuação violenta das forças repressivas do Estado e de grupos neofascistas que tentam acabar com as ocupações pela força bruta. Técnicos de muitas universidades já estão em greve, e docentes começam a preparar-se para o desencadear do movimento paredista, que tem, como principal bandeira, a luta contra a PEC 55.
Desse modo, o quadro que enfrentamos é extremamente adverso, ao mesmo tempo em que é decisivo para nosso porvir. A greve que se anuncia será um movimento defensivo. Não estão pautados aumentos salariais ou modificações na carreira, e sim, a defesa de direitos fundamentais – inclusive do direito à greve e à livre manifestação – gradativamente minados por um regime que está em uma transição regressiva de uma democracia frágil (coroada pela Constituição de 1988) para outra coisa diferente disso. O que está em jogo é o nosso futuro, enquanto educadores, produtores de conhecimento autônomo, trabalhadores, usuários dos serviços públicos de responsabilidade do Estado brasileiro, ou seja, como cidadãos titulares de direitos sociais. Vamos abrir mão, durante dias, talvez meses, de um pouco do nosso conforto, da normalidade de nosso cotidiano de trabalho, da preocupação em cumprir o calendário, do gozo de nossas férias no período anteriormente planejado, em nome de não abrir mão de tudo isso nos próximos 20 anos!
Vamos construir o dia 11 como um grande dia de paralisações e lutas!
Rumo à greve dos servidores públicos para resistir aos ataques!
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